Angústia, desconforto, indignação, culpa e um leve desejo de sumir por uns três dias. Esses são apenas alguns dos efeitos colaterais provocados por “Adolescência”, minissérie que virou debate nacional — ou, para ser mais preciso, um espelho que ninguém pediu, mas todo mundo acabou olhando.
A série, em quatro episódios que parecem durar uma eternidade emocional, joga luz sobre o abismo que pode existir entre pais e filhos — especialmente quando o Wi-Fi está funcionando, os emojis estão atualizados e os adultos, francamente, não fazem ideia do que estão fazendo. A pergunta que assombra quem assiste é simples e incômoda: “isso poderia acontecer comigo?” Spoiler: sim.
O problema não é amar pouco. Aliás, os pais da série amam, cuidam, pagam boletos e compram vitaminas. O problema é achar que isso resolve tudo. Adolescência esfrega na cara do público aquilo que os manuais de criação esquecem de mencionar: é possível amar muito e, ainda assim, não ter ideia de como conversar com seu filho sobre nada mais complexo do que “como foi na escola?”.
Enquanto isso, pais no mundo real seguem mergulhados em listas de “faça isso” e “evite aquilo”, que mais servem para reforçar a culpa do que para ajudar. “Tenha tempo de qualidade”, “converse com seu filho”, “demonstre amor”, “não seja autoritário nem permissivo”, “não respire errado”. Mas alguém poderia, por favor, mostrar o tutorial completo?
A série não entrega soluções mágicas — até porque elas não existem —, mas convida a olhar para o óbvio que a rotina atropela: a conexão com os filhos começa muito antes do primeiro boletim vermelho ou da primeira crise existencial com trilha sonora indie. Começa na infância, no ritual do banho com música, na historinha antes de dormir, no olhar que diz “eu vejo você” mesmo quando o mundo lá fora grita mais alto.
E não, criar vínculo não é marcar no Google Agenda uma hora de conversa profunda com seu pré-adolescente. É fazer uma massagem no pé enquanto pergunta, com jeitinho, “o que te deixou chateado hoje?”. É parar de comparar com o irmão gênio da família ou o primo que já investe na bolsa aos 11 anos. É valorizar o esforço, mesmo quando o adolescente só conseguiu se atrasar um pouco menos.
Pais, não se enganem: seus filhos não acham você chato só porque você impõe limites — eles acham você chato porque só aparece para cobrar e fiscalizar. Troque a patrulha da lição pelo “sabia que eu também mentia para não ir à escola?”. Humanize-se. Eles não precisam de super-heróis. Precisam de gente que erra, acerta e admite que também não sabe lidar com tudo.
“Adolescência” não é só uma série sobre jovens em crise. É sobre adultos tentando não surtar enquanto descobrem que amar um filho é só o começo. O resto é tentativa, escuta, e uma dose diária de humildade parental.
E como diz Eddie Miller, o pai mais perdido (e realista) da série: sempre dá para fazer melhor — desde que a gente pare de achar que já está fazendo tudo certo.
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