João nasceu Maria no papel. Durante anos, evitou mostrar documentos, constrangido por um nome que não o representava. Foi só em 2022 que encontrou o caminho legal para alinhar sua identidade com sua verdade. “Não foi só uma mudança de nome. Foi a primeira vez que me senti reconhecido pelo Estado como eu realmente sou”, conta.
Histórias como a de João têm se tornado cada vez mais comuns na Paraíba, onde pessoas trans e não binárias maiores de 18 anos já podem retificar prenome e gênero diretamente em cartórios de registro civil, sem necessidade de ação judicial. O procedimento é gratuito, e a burocracia, reduzida.
A mudança é respaldada pela Lei Federal 14.382/2022, que simplificou a correção do registro civil para a população trans, garantindo o direito à identidade autopercebida — ou seja, aquela com a qual a pessoa se reconhece. Para dar início ao processo, basta apresentar documentos básicos, como RG, CPF, comprovante de residência e, se houver, certidão de casamento. O requerente também deve entregar um pedido formal, declarando sua vontade de mudar o prenome e/ou o gênero.
O cartório, então, verifica a documentação e a identidade da pessoa. Se tudo estiver em conformidade, o registro é alterado. A comunicação é feita automaticamente aos órgãos emissores de documentos como o CPF, o RG e o título de eleitor. Ainda assim, é responsabilidade da pessoa solicitar a atualização em outros cadastros, como carteira de trabalho, registros acadêmicos e planos de saúde.
A Paraíba tem investido em ampliar o acesso a esse direito. Mutirões de retificação de nome e gênero são organizados periodicamente pela Defensoria Pública do Estado (DPE-PB), em parceria com cartórios e movimentos sociais. O Espaço LGBT, coordenado pelo Governo da Paraíba, também oferece orientações e suporte durante o processo.
“Para muita gente, é um passo pequeno. Para nós, é a vida voltando pro eixo”, diz Amanda, mulher trans que retificou seus documentos em João Pessoa no ano passado. “É ser chamada pelo nome certo. É existir com dignidade.”
A recomendação para quem deseja fazer a retificação é procurar o cartório mais próximo ou entrar em contato com o Espaço LGBT. A burocracia não desapareceu completamente, mas hoje, para quem já enfrenta tantos desafios diários, o caminho está mais aberto — e mais humano.
Hermano Araruna
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