Na ladeira histórica de Santa Teresa, entre bondinhos, azulejos e boemia, mora uma entidade que carrega nas mãos a missão de rimar tradição com permanência: a Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Fundada pelo poeta e visionário Gonçalo Ferreira da Silva, a instituição é uma trincheira de papel e xilogravura contra o esquecimento de uma das formas mais genuínas de expressão popular do Brasil.
Ali, não se distribui só literatura — se distribui memória. A Academia edita e faz circular histórias contadas em estrofes de sete sílabas (redondilha maior), com linguagem direta e sabor nordestino, mas que alcançam leitores de todas as regiões. É um trabalho de resistência cultural feito no compasso do repente e da saudade.
Mais que preservar o cordel, a entidade combate velhos estigmas. Durante décadas, o gênero foi tratado com desdém por setores da crítica, como se fosse literatura de segunda classe. Gonçalo e seus pares apostaram no contrário — e venceram: hoje, o cordel é reconhecido oficialmente como patrimônio cultural do país, um título conquistado sem abandonar a humildade nem os folhetos baratos vendidos em feiras e calçadas.
A Academia, além de reunir nomes consagrados e novos talentos, promove encontros, oficinas e projetos de fomento à leitura. É uma mistura de museu vivo com casa de criação, onde os heróis do povo continuam enfrentando dragões, coronéis e injustiças — agora também nas redes sociais.
Em tempos em que muita coisa rima com esquecimento, o cordel segue rimando com resistência. E lá do alto de Santa Teresa, o verso segue firme, como um carro de boi subindo a ladeira: lento, forte e cheio de história para contar.
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