A Academia Brasileira de Letras viveu, nesta quinta-feira (11), um daqueles raros momentos em que o peso do passado encontra, enfim, algum sinal de mudança. A escritora Ana Maria Gonçalves foi eleita para a cadeira 33 da ABL, tornando-se a primeira mulher negra a ocupar um dos 40 assentos da instituição fundada em 1897. Demorou mais de um século, mas chegou.
Autora do aclamado romance Um defeito de cor, Ana Maria recebeu 30 votos entre os imortais da Casa de Machado de Assis, vencendo com folga uma disputa que contou com outros 12 candidatos, entre eles a também escritora e ativista indígena Eliane Potiguara. A vaga era do linguista Evanildo Bechara, falecido em maio, e que ocupava a cadeira desde 2001.
Natural de Ibiá, em Minas Gerais, Ana Maria Gonçalves começou a carreira como publicitária, mas foi na literatura que encontrou sua voz mais potente. Com uma obra que transita entre a ficção histórica e o compromisso com as memórias negras no Brasil, seu nome vinha sendo cogitado havia anos como um acerto que a ABL precisava fazer — e, finalmente, fez.
A eleição de Ana Maria não corrige as ausências acumuladas ao longo de mais de um século, mas abre espaço para que novos nomes — com outras vivências, outras vozes e outros caminhos — comecem a habitar os salões antes fechados da Academia.
O fato de, em 2025, ainda estarmos falando da primeira mulher negra a entrar ali é revelador. Mas que a notícia seja, agora, também um ponto de virada. E que Um defeito de cor, ao ocupar o lugar de honra que sempre mereceu, ajude a iluminar os próximos passos de uma instituição que, enfim, parece disposta a ouvir o país real.
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