Enquanto o país tenta vender ao mundo a imagem de nação acolhedora e vibrante, a realidade dentro de casa segue brutal. O Brasil alcançou em 2024 um novo patamar, infelizmente vergonhoso, no ranking da violência de gênero. Segundo o 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 1.492 feminicídios no ano, média de quatro mulheres assassinadas por dia. Estupros? Foram 87.545 casos, ou uma vítima a cada seis minutos. Uma espécie de relógio da barbárie.
A alta foi tímida em números percentuais, 0,7% nos feminicídios, 0,8% nos estupros em geral e 1% nos estupros de vulneráveis em relação a 2023. Mas não se engane: mesmo com variações pequenas, os índices são os maiores da série histórica. É o tipo de crescimento que ninguém deveria normalizar.
Entre as vítimas de feminicídio, a maioria tinha entre 18 e 44 anos (70,5%) e foi morta dentro do próprio lar (64,3%). Em quase 80% dos casos, o assassino era o parceiro ou ex-parceiro, o que escancara que o “até que a morte nos separe” segue sendo levado ao pé da letra por muitos.
A violência também tem cor: 63,6% das mulheres assassinadas eram negras, evidência clara de que o racismo e o machismo andam de mãos dadas. Armas brancas foram o instrumento preferido em 48,4% dos crimes, seguidas por armas de fogo (23,6%).
Geograficamente, o mapa da violência tem seus próprios destaques: Mato Grosso lidera com 2,5 feminicídios por 100 mil mulheres, seguido por Mato Grosso do Sul (2,4) e Piauí (2,3). Já os estados com as menores taxas foram Amapá (0,5), Sergipe (0,8) e Ceará (0,9). São Paulo e Rio de Janeiro apresentam taxas abaixo da média, mas concentram quase um quarto de todos os feminicídios registrados no país.
No campo dos estupros, os números também são estarrecedores. Cerca de 77% das vítimas tinham menos de 14 anos, casos tipificados como estupro de vulnerável. E o problema não se limita ao abuso em si: assédio sexual cresceu 7%, importunação sexual 5% e pornografia infantil 13%.
Sim, é possível que parte desse crescimento esteja ligada a uma maior disposição para denunciar. Mas o dado mais assustador talvez seja esse: desde 2011, o número de estupros no Brasil dobrou.
Enquanto isso, seguimos atualizando estatísticas, empilhando corpos e relatórios, esperando, quem sabe, que um dia a política pública chegue antes da tragédia.
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