Há noites em que o céu parece tão distante que quase esquecemos que fazemos parte dele. Laurens van der Post, viajante inquieto, descobriu isso no deserto do Kalahari, quando se sentou diante da fogueira com os bosquímanos (grupo de povos indígenas do sul de África, conhecidos por serem uma das culturas de caçadores-coletores mais antigas do mundo e de quem todos os humanos modernos descendem). Eles falavam das estrelas como quem fala de vizinhos íntimos. Não comentavam sobre brilho, formas ou constelações, mas sobre o som que vinha delas.
Sim, o som.
As estrelas, diziam, cantavam. Vibravam melodias que só o coração inteiro conseguia ouvir. Laurens, curioso, tentou acompanhar aquela sinfonia celeste. Apertou os olhos, respirou fundo, concentrou-se. Nada. Apenas silêncio.
Ao revelar que não ouvia, foi recebido com surpresa, quase como se estivesse pregando uma peça. Quando perceberam que falava sério, os bosquímanos se entristeceram. Olharam-no com pena, como quem contempla alguém amputado de um sentido essencial.
Para eles, não ouvir as estrelas era mais que uma limitação: era a prova de que o homem ocidental havia se desligado do mundo. Enquanto erguiamos fábricas, carros e cidades de barulho ininterrupto, havíamos perdido a música primeira, a canção que une céu, terra e gente.
Laurens entendeu, naquela noite, que a compaixão não era só por ele. Era por todos nós, herdeiros de um progresso que cobre os ouvidos.
E desde então, cada vez que olho o céu, não consigo deixar de pensar: e se as estrelas ainda cantam, mas fomos nós que desaprendemos a escutar?
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