Autocuidado não é sobre se agradar. Não é uma fuga, nem uma conquista. É, talvez, o mais profundo dos confrontos, aquele que você trava consigo mesmo quando ninguém está olhando. Não se trata de algo que se exibe, mas de uma continuidade silenciosa, o movimento repetido de quem se recusa a desaparecer. Às vezes, é um copo d’água que você se força a tomar. Não porque quer, mas porque entende que o corpo ainda precisa de você, mesmo nos dias em que ele parece não querer colaborar. Ou então, é uma cama arrumada, não porque você tenha forças, mas porque, de algum jeito, isso ainda faz sentido.
Quem já passou pela beira do abismo sabe: o retorno não acontece de uma vez. Não há um grande evento, uma epifania. A jornada é feita de pedaços, de gestos quase insignificantes que, ao longo do tempo, começam a tomar forma. E é nos momentos de quietude que você começa a entender que o autocuidado não é um prêmio, mas uma necessidade. Ele não te cura. Ele te permite existir. Te permite estar, mesmo quando o mundo diz para você se afastar.
A sobriedade, sob essa ótica, não é um estado de negação ou ausência, mas uma presença radical. Não é a eliminação do sofrimento, mas sua aceitação plena. A soberania do autocuidado reside no paradoxo de ser capaz de sustentar a dor sem sucumbir a ela. Cada gesto de cuidado, por mais diminuto que seja, é um ato de subversão: é a reafirmação de que o eu não se dilui diante da adversidade, mas persiste. A sobriedade se constrói no cotidiano, não como um ideal abstrato, mas como uma prática que se desvela em cada movimento.
O autocuidado, então, não é um clamor. Não é um grito por reconhecimento, mas um suspiro de resistência silenciosa. Ele não exige aplausos, pois se nutre da solidão e da quietude dos momentos em que, sem alarde, o sujeito afirma a sua própria permanência. Não há retribuição, apenas o reconhecimento tácito de que, contra todas as probabilidades, a existência persiste, e com ela, a capacidade de se reencontrar. Ele não é linear, nem perfeito, mas é real. E, talvez, seja essa a única verdade que importa: o cuidado começa quando você decide, de maneira silenciosa, que não vai mais desistir de si mesmo.
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