O embate jurídico em torno do Oceânica Cabo Branco, um dos empreendimentos mais controversos da orla de João Pessoa, ganhou novo capítulo nesta semana. O juiz convocado Miguel de Brito Lyra Filho, do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), decidiu suspender a autorização que liberava a emissão do habite-se, documento necessário para a ocupação do prédio.
A medida atende a um recurso apresentado pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB), que questionou a decisão anterior da 3ª Câmara Cível. O colegiado havia autorizado a expedição da licença no mês passado, mas, segundo o MP, deixou de lado pontos considerados centrais: a possível violação da chamada “Lei do Gabarito”, norma que restringe a altura das construções na orla e a ausência de comprovação de que não haveria impactos ambientais decorrentes da obra.
Em sua decisão, Miguel de Brito foi categórico ao destacar que há risco de “dano irreversível ao meio ambiente e à segurança da sociedade”, caso a construção seja liberada sem a devida análise final da Justiça. O magistrado também mencionou que o caso guarda semelhança com outro processo já apreciado pela presidência do TJPB, reforçando a necessidade de cautela.
O Oceânica Cabo Branco se tornou símbolo da disputa entre interesses econômicos do setor imobiliário e a defesa de uma legislação urbanística que há décadas busca preservar o perfil da orla pessoense. Ambientalistas e urbanistas alertam que decisões pontuais de flexibilização da lei podem abrir precedentes perigosos para a cidade, já pressionada por uma crescente especulação imobiliária.
Do outro lado, construtoras e investidores defendem que a modernização da orla é inevitável e que projetos como o Oceânica trariam benefícios econômicos, com geração de empregos e valorização da região.
A suspensão do habite-se não significa o fim do processo, mas impõe um freio num cenário em que os efeitos de uma decisão precipitada poderiam ser irreversíveis. Até lá, a discussão sobre como conciliar desenvolvimento urbano, preservação ambiental e respeito à legislação seguirá alimentando um dos debates mais inflamados de João Pessoa.
Essa decisão sobre o Oceânica Cabo Branco coloca João Pessoa diante de um dilema quase kafkiano: o prédio está de pé, erguido no coração da orla, mas sua legitimidade jurídica e ambiental continua em suspenso. É como se a cidade vivesse um paradoxo: uma construção física concreta, visível a quem passa na região da praia, mas que ainda não existe do ponto de vista legal.
O problema expõe uma ferida antiga da capital paraibana: a distância entre o que se constrói na prática e o que se permite pela lei. A Lei do Gabarito não é apenas uma norma urbanística, mas um pacto histórico de preservação do horizonte da orla, feito para garantir que João Pessoa não repeta o colapso paisagístico de cidades como Recife ou Natal, onde arranha-céus engoliram o mar. Ao permitir exceções sucessivas, o poder público fragiliza a credibilidade da regra e dá a sensação de que basta ter fôlego econômico e bons advogados para dobrar a lei.
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