Antes de virar estampa em bandeirolas e tema de músicas animadas no arrasta-pé, João Batista foi um homem do deserto, um profeta que trocou o conforto da cidade pelo silêncio da fé. Vivendo no mesmo tempo que Jesus, ele batizava pessoas às margens do Rio Jordão, anunciava a chegada do Messias e, por isso, ganhou da Igreja Católica o título de “precursor de Cristo”. Com uma vida marcada pela oração, renúncia e martírio, João também deu origem — talvez sem imaginar — a um dos ciclos festivos mais vibrantes do Brasil: o São João.
A devoção ao santo tem raízes profundas no catolicismo e se entrelaça com a cultura popular, especialmente no Nordeste. As festas juninas, celebradas em junho, têm em São João seu principal homenageado. Seu nascimento, comemorado no dia 24, virou ponto alto do calendário religioso e social. O fogo que simbolizava o anúncio de seu nascimento, segundo a tradição cristã, virou ritual: a fogueira acesa não é só símbolo de fé — é um código cultural que resiste ao tempo.
Reza a história que Isabel, mãe de João, teria acendido uma fogueira para avisar à prima Maria que o filho havia nascido. Esse gesto simples, de comunicar pelo fogo, acendeu uma tradição que hoje move multidões. Em cidades como Caruaru (PE), a fé e a festa caminham lado a lado. Lá, a maior fogueira do mundo é acesa anualmente para marcar o fim do ciclo junino, durante a celebração de São Pedro, mas sempre em memória do santo que deu início a tudo.
João também é lembrado por sua morte trágica: foi preso por criticar o rei Herodes e acabou decapitado a pedido de Salomé. A Igreja Católica reserva duas datas para lembrá-lo: 24 de junho (nascimento) e 29 de agosto (martírio). Mas, no Brasil, é em junho que ele ganha protagonismo — não nos altares, mas nos palcos, nos arraiais, nos sítios, nas comunidades.
Mais do que personagem bíblico, São João tornou-se um elo entre fé e festa, entre tradição e resistência cultural. Em tempos de comunicação instantânea, ele ainda é lembrado por ter usado uma fogueira como aviso — e por ter acendido, sem querer, um dos maiores símbolos de identidade do Nordeste.
Se no deserto ele preparou o caminho para Cristo, no Brasil, semeou o caminho de uma celebração que resiste há séculos — com fumaça, forró e fé.
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