No Brasil, a violência contra mulheres já virou rotina de calendário. No primeiro semestre de 2025, foram 718 feminicídios e quase 34 mil estupros. São quatro assassinatos e 187 violações sexuais todos os dias. Mas não se preocupe: amanhã terá futebol, novela e promoções no e-commerce para distrair.
O Mapa Nacional da Violência de Gênero, divulgado pelo Instituto Natura e pelo Observatório da Mulher contra a Violência do Senado, escancara o óbvio: o país é um cemitério de mulheres. Desde a aprovação da Lei do Feminicídio, em 2015, já são 12.380 mortas. Para efeito de comparação, é como se uma pequena cidade inteira tivesse sido exterminada, mas diferentemente de tragédias que mobilizam manchetes internacionais, essa carnificina segue recebendo o carimbo de “mais um dado estatístico”.
São Paulo lidera com 128 mortes, seguido de Minas Gerais (60), Bahia (52), Rio de Janeiro (49) e Pernambuco (45). O ranking é didático: o problema não é geográfico, é cultural. E, convenhamos, não há lei que dê conta quando o machismo é tratado como patrimônio nacional, transmitido de geração em geração com a mesma naturalidade do samba e do futebol.
Os números de estupro, então, beiram o grotesco: 33.999 casos em seis meses. É quase como se houvesse uma fila organizada de agressores, cada um esperando sua vez de reforçar que, no Brasil, o corpo da mulher ainda não lhe pertence. E, como de costume, sobram desculpas: “ela provocou”, “foi um mal-entendido”, “é um caso isolado”. Casos isolados que, curiosamente, se repetem quase 200 vezes por dia.
A resposta do Estado? Notas oficiais, campanhas tímidas, discursos vazios. O resto é improviso. Afinal, investir em prevenção, educação e políticas públicas custa caro. Mais barato deixar que as estatísticas façam o serviço: contam, arquivam e, principalmente, anestesiam.
A sociedade, por sua vez, participa ativamente desse espetáculo. Indigna-se por alguns minutos no feed, compartilha um post de luto, depois volta à rotina. Se a violência contra a mulher fosse uma série de streaming, talvez tivesse mais audiência. Mas como não tem enredo novo, apenas repetição da mesma tragédia, já não gera engajamento.
O Brasil não é apenas violento com suas mulheres. É cúmplice. O silêncio, a apatia e a banalização são tão criminosos quanto o disparo, a facada ou a agressão sexual. E enquanto seguimos tratando a barbárie como “normalidade”, o cemitério de mulheres cresce. Silenciosamente, claro.
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